quarta-feira, 20 de junho de 2012

Você é feliz?


Estava ontem mesmo em uma mesa de bar comentando que uma das maiores crises da minha vida (são várias, claro) já não é mais tão grande assim. Quando comecei o meu primeiro estágio, aos 19 anos, eu olhava ao meu redor, via pessoas exercendo o mesmo cargo dentro da mesma empresa fazia pelo menos uns cinco anos, e aquilo me desesperava. Eu achava medíocre, não entendia como alguém conseguia manter-se equilibrado vivendo uma rotina sem grandes novidades, convivendo com os mesmos chefes de sempre, com as mesmas broncas de sempre, e falando mal das mesmas pessoas de sempre.
As minhas crises eram sérias e, aos 21, já beiravam o desespero. Depois de três anos, eu percebi que tinha acontecido comigo aquilo que eu mais desprezava na vida: batia cartão de manhã, carregava uma bandeja na hora do almoço e esperava o fretado à noite. Foi quando pedi demissão pela primeira vez, logo depois de sentir vontade real de me jogar pela janela da empresa. Resolvi me isolar desse mundo onde eu tinha me metido e viajar por dois anos, fazendo dinheiro sozinha.
Hoje, seis anos depois, sinto que consegui lidar melhor com a velocidade das informações e com o tamanho da janela da vida alheia. São tantas possibilidades que nos chegam via facebook, twitter e blogs que, para mim, a minha vida sempre seguia um caminho menos interessante do que o potencial que parecia ter. A sensação era a de que todo mundo estava vivendo, menos eu. De tão grande, essa paranoia alcançou de forma natural a minha vida afetiva, e me fazia achar que eu sempre poderia estar com alguém mais interessante – o que o sociólogo polonês Zygmunt Bauman explica bem em seu “Amor Líquido”.
Depois de dois anos com um ritmo bem menos frenético e dependendo mais da força física para viver (na Europa, a bike foi meio de transporte, que eu usava para chegar no restaurante onde trabalhava como garçonete e às casas de gente que queria aprender português, quando dava aulas). Eu deixei de lado o computador e a vida alheia por um bom tempo e consegui ficar mais calma, focar mais em mim.
Por isso, quando assisti a All Work All Play, da empresa de pesquisa Box 1824, entendi duas coisas: sim, somos o que queremos ser e, não, não existe aquela plenitude, em que quem gosta de escalar passa a vida escalando, ou quem gosta de pintar consegue viver disso tranquilamente, e atuar é simples e fácil, basta querer. Não. Independentemente da geração em questão, o nosso sistema capitalista exige de nós um protocolo: cartão de débito e crédito na carteira, contas pagas no fim do mês e, finalmente, a fonte do dinheiro que vai nos possibilitar viver e nos divertir, como sugere o vídeo. Assim funciona para quem não é herdeiro nesse mundo: temos que trabalhar.
Nem preciso dizer que acho injusta a pergunta que abre e fecha o tal vídeo: “O que você está fazendo agora? É algo que realmente ama?” É como se quem faz parte dessa geração tivesse todas as possibilidades do mundo, e se não faz o que quer, é porque não quer. Então depois de ver que todo mundo está feliz da vida – pelo menos virtualmente – todos os dias, ainda somos pressionados para alcançar a tal da felicidade plena? Essa nós só vamos enxergar quando entendermos que a vida não é feita de plenitude, mas de altos e baixos.
Antes de assistir ao vídeo, eu estava lendo a entrevista que a atriz Mariana Lima deu nas páginas vermelhas da revista TPM no ano passado, e a opinião dela sobre os altos e baixos em um casamento - muito cabível, pra mim - pode perfeitamente servir de metáfora para a vida. Eis o trecho da entrevista que me interessa aqui:

Você continua apaixonada depois de 12 anos de casamento? 
Não. Mas tenho surtos de paixão. Tem uma hora que fica só "amorzinho", papaizinho, mamãezinha. Depois fica ruim, e cada um fica num canto. Aí fica bom de novo. Loucamente bom, sexualmente bom. E começa tudo de novo... 

Me parece que a vida obedece o mesmo ciclo. Ontem à noite, no bar, comentei que estava conseguindo me livrar das crises de achar que tenho que ser sempre melhor. Parece que finalmente consegui levar uma vida mais aliviada, um dia de cada vez. E aí hoje eu assisto a um vídeo que vem me dizer o contrário: “por que você não está lá fora, fazendo o que realmente quer?” (E o que eu realmente quero? Quem é esse locutor pra me dizer implicitamente que eu tenho que SABER o que eu quero?).

Essa empresa de pesquisa está divulgando o que todos sabemos: hoje em dia há mais possibilidades e mais facilidades, graças a deus não é mais um bom sinal passar 20 anos trabalhando no mesmo lugar, e podemos muito bem ter nossos talentos reconhecidos independentemente da idade – e trabalhar de igual pra igual, e muito harmoniosamente, com quem tem mais experiência de vida, ou até abrir nosso próprio negócio cedo. Eu mesma penso direto nisso. Me sinto livre, sim, e isso é legal. Agora, aumentar a ilusão de que “você” leva uma vida de obrigações enquanto poderia sair por aí saltando de paraquedas é um pouco desleal. E o cara que editou as imagens desse vídeo? É feliz? Não acho justo fazer uma pergunta dessas.
Sabe aqueles desenhos das donas de casa felizes do pós guerra? (tipo esse aí de cima?) Aquilo era propaganda. Era propaganda da vida perfeita, que deveria ser levada, uma promoção daquela conjuntura. Fazendo esse paralelo, All Work All Play me parece mais do mesmo.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Mergulha, Angélique!




Primeiro, me senti a própria Camille: ela sabe que encontrou o homem da vida dela, mas fica questionando o coração o tempo todo. Depois, a Angélique me fez ver que, na verdade, eu preciso começar a fazer parte de um grupo tipo o Émotifs Anonymes; é tanto medo que os sentimentos às vezes ficam presos na garganta, sem entender que precisam (e podem) sair de mim.

Dos dois filmes, eu saí chorando. Depois de ver Adeus, Primeiro Amor (Mia Hansen-Love), confesso que eu senti uma angústia que nem sabia de onde vinha: as lágrimas que corriam no meu rosto eram de tristeza, mas eu não estava triste. Chorei porque entendi que a Camille (a linda Lola Créton) se forçou a dizer adeus a seu primeiro amor. E daí que quatro anos se passaram, que a menina amadureceu e que vive com o homem que a fez finalmente sentir-se mulher? E daí tudo isso se ela ainda fugiria com aquele moleque, mesmo depois de tanto tempo?

Hoje, quando terminou a sessão de Românticos Anônimos (Jean-Pierre Améris), eu também chorei, mas de felicidade (chorar de felicidade no cinema = Émotifs Anonymes urgente pra mim!). E depois de relacionar os dois filmes, que, tirando o fato de serem franceses, não têm nenhuma ligação à primeira vista, entendi que tinha ficado triste à toa.

Em Adeus, Primeiro Amor, Camille, ainda adolescente, é deixada pelo namorado que ama, e só depois de quatro anos longe dele consegue se apaixonar de novo. Ela se envolve com um homem mais velho, por quem sente um amor maduro, mas ainda precisa dar o último adeus ao menino que cortou seu coração. Românticos Anônimos é mais leve: conta com graça a história de Angélique (Isabelle Carré), uma mulher tímida que cria chocolates, mas acaba contratada como represente de vendas em uma fábrica (de chocolates!), tamanha dificuldade que tem em se expressar. Ela se envolve quase que por acaso com o novo chefe, que é ainda mais 'émotif'. Os dois têm medo de tudo - e é justamente a semelhança que assusta Angélique: como a união deles poderia um dia dar certo? Não são os opostos que se atraem? Há dois meses, eu percebi que não exatamente...

Fiquei triste à toa quando chorei no fim de Adeus, Primeiro Amor porque não entendi, de primeira, que a Camille não quer deixar o primeiro amor ir embora do coração dela por puro medo. Ou não seria mais fácil encarar um relacionamento com um moleque que ela (acha que) já conhece, e com quem sempre vai se sentir à vontade, com aquela leveza de adolescente, do que enfrentar o desconhecido em uma relação madura, que joga na cara dela o tempo todo que ela cresceu?

Foto 1: não precisa ter medo, Angélique,

Foto2: e não precisa chorar, Camille;

Foto 3: tá tudo bem.